Sistema alimentar e transição energética – reflexões para o futuro 41 modelos, embora com recurso a tecnologias diferentes, alinham com o conceito de intensificação sustentável que procura o equilíbrio entre o aumento da produtividade das culturas e a redução de inputs, sem expandir o uso da terra (Cassman e Grassini, 2020). Muitos deles são passíveis de serem desenvolvidos em ambiente ‘urbano’, em condições de resiliência climática, isto é, não expostos diretamente aos riscos de extremos climáticos, o que representa uma enorme vantagem face a sistemas convencionais. Os hábitos e padrões de consumo determinam o perfil do sistema alimentar, sendo por isso uma componente muito importante. Importa referir o boom atual do mercado de alimentos à base de plantas que, segundo a Bloomberg Intelligence (2021), pode representar 7,7% do mercado global de proteínas até 2030, com um valor de mais de US$162 mil milhões, ficando acima de US$29,4 mil milhões já em 2020. A tendência para opções de base vegetal tem vindo a conhecer taxas de crescimento muito grandes, sobretudo junto da população mais jovem. No Reino Unido, estima-se que mais de 2 milhões de pessoas aderiram ao movimento Veganuary (consumir apenas alimentos baseados em plantas durante o mês de janeiro) em 2023, o que compara com 500 000 em 2021 e 100 000 em 2020, refletindo uma taxa de adesão extraordinária. Atendendo à explosão de modelos de produção de alimentos, intensivos em tecnologia e por isso de elevada intensidade energética, bem como a importância atual da produção local de eletricidade, é urgente explorar a interface, atual e futura, entre sistema energético e sistema alimentar, e uso de água. Em particular, importa considerar desde já os seguintes aspetos: i) avaliar a eficiência do uso de recursos (pelo menos em energia, água, solo, fertilizantes) de novos sistemas de produção de alimentos, incluindo os modelos indoor, intensivos em tecnologia, como agricultura digital, agricultura celular, tecnologia genética, e agricultura em ambiente controlado (e.g. hidroponia, aeroponia), por comparação com sistemas convencionais para a produção do mesmo tipo de alimento. ii) avaliar se os novos sistemas de produção de alimentos, baseados em tecnologia podem induzir a alteração para cadeias curtas e muito curtas de transporte e distribuição de alimentos para os centros consumidores, e qual o impacto no consumo de energia e respetiva pegada de carbono, bem como na potencial libertação ou expansão da superfície agrícola; iii) perspetivar de que modo as novas tendências relativas ao sistema alimentar, governadas por valores individuais e culturais (e.g. dietas baseadas em plantas), ou pela inovação (e.g. agricultura celular) pode impactar a procura de serviços de energia e uso de água. iv) avaliar se a visão de um modelo de prosumers de alimentos (produção por famílias e empresas não-agrícolas) é viável e em que condições, acompanhando a tendência dos prosumers de energia (projeta-se para 2050, em Portugal, que a produção descentralizada de electricidade represente 25% do total, APA, 2019). A transição climática sustentável está a obrigar a alterações de paradigma em vários domínios sociais e da economia, incluindo na agricultura. É neste contexto de inovação, acelerado pela premência das alterações climáticas, que a reflexão sobre os dados revelados pelo Recenseamento Agrícola 2019 deve fazer-se, com o intuito de percecionar e desenhar o futuro da agricultura portuguesa. Da perspetiva da neutralidade climática, não é possível equacionar-se este futuro sem a sua ligação ao uso Estes modelos alinham com o conceito de intensificação sustentável que procura o equilíbrio entre o aumento da produtividade das culturas e a redução de inputs, sem expandir o uso da terra. …o nexus energia-água-alimentos deve ser a base para a análise de dados, para a discussão de políticas públicas e inclusivamente para a formação de recursos humanos.
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