Cultivar_3_Alimentação sustentável e saudávell

Intensificação sustentável: um novo modelo tecnológico na agricultura 17 A nível global, a generalização do modelo químico- -mecânico, mesmo nos países em desenvolvimento (a chamada revolução verde), permitiu multiplicar por três a produção global de cereais desde 1950, com base na adoção de variedades de trigo, arroz e milho de alto rendimento, na multiplicação por três da área irrigada e na multiplicação por onze do uso global de fertilizantes de origem industrial (Brown, 2004). Um novo modelo tecnológico: intensifica- ção sustentável Necessidade de aumentar a produtividade do tra- balho esteve, como vimos, na origem do modelo tecnológico químico-mecânico em agricultura. Do desenvolvimento deste modelo resultou o aumento da produtividade da terra (intensificação agrícola), através do aumento da utilização de inputs indus- triais, geralmente acompanhado de redução da efi- ciência com que os mesmos são utilizados. Hoje, ultrapassar o dilema da intensificação implica aumentar a produtividade da terra (a parte boa da intensificação) sem aumentar o uso de inputs por hectare (a parte má), o que requer ganhos muito significativos na eficiência de utilização destes inputs ( more crop per drop ). De facto, definida como nível de produção por hectare, e não como nível de inputs por hectare, a intensificação agrícola pode, como vimos, ser a chave para satisfazer a procura crescente de alimentos, bioenergia e biomateriais, evitando, ao mesmo tempo, a conversão maciça de habitat natural em terras agrícolas, a qual teria um custo ambiental insustentável. No âmbito do modelo químico-mecânico, os aumentos de produção por hectare do passado foram geralmente conseguidos à custa de aumen- tos do nível de inputs por hectare. Deste modo, os consumos agrícolas de adubos, pesticidas, água ou energia multiplicaram-se globalmente por diversos fatores ao longo das últimas décadas. Este cres- cimento no uso de inputs determinou uma redu- ção da eficiência com que os mesmos são utiliza- dos na produção agrícola, sendo necessárias doses crescentes de inputs para obter acréscimos suces- sivos idênticos do nível de produção (lei dos ren- dimentos decrescentes). Esta redução de eficiên- cia, conjugada com o incremento generalizado do consumo de inputs , deu origem a uma diversi- dade de problemas ambientais, como a eutrofiza- ção dos ecossistemas aquáticos, o envenenamento das cadeias alimentares, o declínio dos aquíferos e caudais, e ainda a emissão maciça de gases com efeito de estufa pela agricultura. Além disso, traduz- -se também frequentemente em custos mais eleva- dos, menor qualidade e segurança dos alimentos, menor competitividade e maior vulnerabilidade face ao fim da era da energia barata. Deste modo, o novo modelo tecnológico deverá centrar-se em desligar, tanto quanto possível, o aumento da produção por hectare do nível de utili- zação de inputs industriais por hectare. Esta direção de mudança permitir-nos-á criar uma agricultura ao mesmo tempo mais competitiva, mais amiga do ambiente e mais resiliente face à escassez cres- cente de água e à subida do preço da energia. Esta direção de mudança poderá vir a configurar-se num modelo tecnológico alternativo ao modelo quími- co-mecânico, e tem vindo a ser designada como intensificação sustentável (Royal Society, 2009). O grau em que conseguiremos desligar, no futuro, produção por hectare e nível de inputs por hectare não é ainda muito claro. Há certamente limites a esta estratégia tecnológica para produzir mais com menos e, assim, reduzir trade offs entre ambiente e economia, ao mesmo tempo que aumenta a pro- dução por hectare. Estes limites são mais eviden- tes a curto prazo e devem-se sobretudo aos chama- dos lock-ins tecnológicos (a prova mais evidente da existência de modelos tecnológicos). Por exemplo, a total expressão do potencial genético das varie- dades de plantas que hoje usamos na agricultura depende de agroecossistemas simples, com redu- zida competição, mas também com reduzida ajuda

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