Cultivar_30

66 CADERNOS DE ANÁLISE E PROSPETIVA CULTIVAR N.º 30 ABRIL 2024 – Melhoramento e técnicas genómicas A Plataforma Transgénicos Fora2 defende uma agricultura sustentável orientada para a proteção da biodiversidade e do direito dos povos à soberania sobre o seu património genético comum. É composta por dez organizações do ambiente, da agricultura e do desenvolvimento rural, e ainda centenas de apoiantes a título individual. 1. Aumentar a produtividade em termos agronómicos é um desafio essencial para a humanidade. Isso pode ser alcançado apenas com práticas e tecnologias existentes? Esta temática carece de uma contextualização introdutória. A busca incessante de novidade e invenção, inerente à condição humana, tem propulsionado o veloz progresso da espécie humana. Contudo, apesar de esse ímpeto nos ter trazido tão longe, continuámos comparativamente rudimentares na capacidade para refletir, agir e prever os efeitos desse notável percurso. Foi uma evolução com pesados custos, alguns dos quais irreversíveis como, por exemplo, a extinção de milhares de espécies, a contaminação da cadeia alimentar por microplásticos ou as emergentes alterações climáticas. Deslumbrados por novidades que potenciam ganhos de curto prazo, sistematicamente sabotamos ações que nos protejam das consequências dramáticas do nosso processo evolutivo. Nesta era da (des)informação parece inglória a batalha contra os argumentos falaciosos de lóbis que têm logrado manipular formadores de opinião e decisores políticos. Argumentos auspiciosos e vanguardistas, apresentados com lógicas cristalinas, mas que frequentemente enfermam de fragilidades, ignoram dúvidas importantes e escondem efeitos danosos. 2 https://www.stopogm.net/ 3 https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0743016711000830 4 https://enveurope.springeropen.com/articles/10.1186/2190-4715-24-24 5 https://www.science.org/doi/full/10.1126/science.abe1148 Não existem soluções mágicas para resolver complexas problemáticas mundiais, tais como a insegurança alimentar, a vulnerabilidade alimentar e a pobreza. A tentativa de aplicar expedientes tecnológicos para mitigar a fome no mundo, como os organismos geneticamente modificados (OGM) e lógicas mercantilistas com resultado noutras indústrias, revelou-se uma promessa gorada (exceto para os lucros dos seus promotores) aportando, ao invés, novos e graves problemas3. Sem preconceitos contra as tecnologias, a história exige-nos renovada humildade para revisitar os processos que a natureza afinou durante milhões de anos. A agricultura biológica, por exemplo, resgata princípios da natureza, convocando a biodiversidade e o conhecimento humano para a proteção e o sucesso das culturas. Um solo vivo sequestra carbono e é a base sustentável da abundância alimentar. Sabemos há muito que intervenções significativas nos ecossistemas desencadeiam consequências em cascata, sendo crucial redobrada cautela ao ponderar benefícios, riscos e prejuízos. Urge refrear o deslumbramento pela biotecnologia e perder a credulidade ingénua nos seus agentes: a história está repleta de embustes e de manipulações de pareceres científicos nas indústrias tabaqueira, agroquímica, automóvel, alimentar e outras. É imperativo o escrutínio independente da informação veiculada pelos lobistas e por certos cientistas. Nesta área, a maioria dos investigadores trabalha para a indústria, focam- -se na produção de resultados sem questionamento, e a segurança dos OGM é investigada pela indústria que os cria e comercializa. Há evidências alarmantes, como é o caso dos pesticidas que iam diminuir com os OGM quando o contrário aconteceu4. As infestantes/pragas adaptam-se, aumentam a sua resistência requerendo o aumento crescente e insustentável de pesticidas, cada vez mais tóxicos5.

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