Cultivar_31

122 CADERNOS DE ANÁLISE E PROSPETIVA CULTIVAR N.º 31 AGOSTO 2024 – Sequeiro mau estado do montado; havia criação de gados, com pastoreio de ovelhas, porcos, bois; era relevante a apicultura, com produção de mel e cera; aproveitava-se a lenha e a madeira e havia fabrico de carvão. Regulamentos procuravam proteger os pinhais, autorizando embarque da lenha de pinho apenas depois de dois embarques de tojo: forçava-se assim a limpeza do sub-bosque para procurar evitar incêndios. Mas eram frequentes as queimadas, para roças e fabrico de carvão, mas também para reverdecer os pastos. De notar uma rede urbana densa, com cidades antigas de marca muçulmana, com destaque para Elvas, Évora e Beja, mas que, no entanto, são ilhas no meio das solidões despovoadas das charnecas. O Alentejo é o domínio do trigo, o cereal de maior apreço, com exceção do Norte onde o centeio predomina, mas ambos são semeados em toda a parte: é o centeio dos ganhões e o trigo dos ricos. No entanto, todos os cereais são cultivados no Alentejo: cevada, o mais comum deste grupo, aveia, milho miúdo (o milho antigo) e milho graúdo (o milho moderno e note-se que nem sempre é possível distinguir os dois tipos), mais tarde o arroz, vão aparecendo um pouco por toda a parte (o milho e o arroz mais na orla ribatejana). O afolhamento nos campos abertos pode ser trienal ou quadrienal, mas no sentido de se fazer em três ou quatro tempos e não em três ou quatro anos, podendo ser de 4, 6, 8 ou mais anos. Os nomes clássicos de alqueive, pão e relva, dos três tempos tradicionais podem dar lugar aos quatro tempos quando se faz uma folha de cevada depois do trigo ou uma sementeira no alqueive, de milho miúdo ou leguminosas. Há, assim, uma extrema variação de ritmo nos afolhamentos, expressão duma maior ou menor fertilidade do solo, da importância da criação do gado e da densidade da ocupação humana, e, ainda, das servidões coletivas. Há uma transição entre a cultura regular e o sistema das roças e arroteis episódicas. A partir do quarto ano pode-se considerar a cultura extensiva, a partir do sexto ou do oitavo, temporária ou itinerante. O Alentejo é o celeiro do país, mais exatamente do seu principal centro consumidor, Lisboa, mas é um celeiro insuficiente, representando por vezes menos de 50% do trigo consumido. O trigo das ilhas e do estrangeiro, o trigo do mar, vindo principalmente da Andaluzia e de Odessa, é assim essencial e até, por vezes, mais barato do que o trigo da terra. Nos anos bons, porém, vendia-se até trigo a Espanha. No Alentejo, dominado embora pelo cereal e pelos rebanhos, sempre houve também outras culturas, localmente interessantes, nomeadamente as culturas mimosas: vinhas, hortas e olivais. Designadas por Silbert por culturas ricas, são realizadas em chão revolvido e estrumado em torno dos povoados, constituindo a horta, o pomar, a vinha, no seu conjunto, a quinta que se opõe aos coutos, às herdades. A vinha tem, na época, presença modesta, sendo o olival mais importante: destaca-se em Elvas e é mais raro no Sul (das terras de trigo e das pastagens pouco favoráveis à árvore) e no Ocidente (por causa dos ventos mareiros), mas com a vantagem de se poder associar a oliveira ao pasto ou ao campo, uma vantagem relevante em relação à vinha. Quase todos os autores, do final do século XVIII e do início do século XIX, consideram a criação de gado a atividade agrícola fundamental do Alentejo, a única que permitia compensar os rendimentos aleatórios de terras pobres e de muitos anos maus. Tinha carácter extensivo, aproveitando o pousio como pasto de ovelhas e as charnecas e matagais bravios como pasto de cabras. Com a progressão das grandes arroteias vão aumentar as ovelhas (é uma região muito importante na produção de lã) e reduzem-se as cabras, e com a valorização da cortiça, o montado aumenta e, consequentemente, aumenta também a criação de porcos. Muitos referem as ovelhas, as cabras e os porcos como a causa principal da decadência ou pouco desenvolvimento da agricultura (não pecuária). Todos os factos característicos do coletivismo agrário: pastos comuns, utilização de baldios, repartição periódica de terras, estavam presentes, com diferente incidência e distribuição regional, no Alentejo. Mas estas estruturas comunitárias eram mais impor-

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