CULTIVAR 9 - Gastronomia

Gastronomia portuguesa: heranças antigas, dinâmicas modernas 15 Tradições alimentares e gastronomias locais Depois de termos assistido à desertificação dos cam- pos, ao êxodo para as cidades, em busca de uma vida melhor, essa natureza deixada para trás tor- nou-se alvo de novos olhares. A paisagem de recur- sos tangíveis – arvoredo, plantas, recursos alimenta- res, comunidades, horizontes –, habitada por outros tantos contornos intangíveis – cultura oral, sabe- res, modos de ser –, é classificada como patrimó- nio a preservar e a valorizar. Reconhecidos como endógenos, estes recursos podem ser geradores de novas dinâmicas de desenvolvimento local, nomea- damente quando integrados em práticas de lazer, que articulem entre si a fruição da natureza e das alimentações tradicionais. Aliás, a crescente interde- pendência da trilogia referida de natureza, gastrono- mia e lazer no processo de valorização dos territórios rurais equaciona a necessi- dade de conceber projetos ou estratégias de desenvol- vimento multifuncional e integrado que potenciem a atual atratividade das pai- sagens, dos modos de vida e dos recursos. Nestes últi- mos, interessam-nos par- ticularmente os recursos alimentares locais, bem como os saberes que lhes estão associados. Uns e outros consubstanciam as tradições alimentares que deram lugar às gastronomias locais. Num contexto de liberdade de escolha alimentar, regressar às tradições é, atualmente, aceite como uma prática gastronómica, razão pela qual se alar- gou o âmbito do conceito, para apoiar dinâmicas de valorização das tradições alimentares ancestrais e genuínas de um território. Passou a generalizar-se o uso da gastronomia local, sobretudo, quando se trata de dinamizar as tradições alimentares. Toda- via, estas dinâmicas ocorrem num contexto de declí- nio crescente das cozinhas tradicionais, quer ao nível dos procedimentos culinários, quer ao nível da qualidade dos produtos que lhe conferem a especi- ficidade. Num momento em que tanto se fala da notorie- dade do modelo alimentar mediterrânico, aquele onde se inserem grande parte das nossas tradições, apercebemo-nos de que, nas últimas três déca- das, nos afastámos das suas principais característi- cas, adotando aquilo que se convencionou designar por “modelo de consumo alimentar ocidental”. Tal mudança reflete-se tanto nas consequências para a saúde individual, favorecendo o aparecimento de doenças metabólicas degenerativas devido ao grande aumento do consumo de alimentos ricos em gorduras saturadas e açúcares, como na sustentabi- lidade do mundo rural. Conhecer os usos alimenta- res tradicionais, divulgando a importância da conserva- ção e valorização das espé- cies autóctones que lhes conferem as especificida- des, significa também con- tribuir para a manutenção da diversidade dos saberes e das identidades gastro- nómicas locais. Em última análise, para as promover no contexto urbano como soluções alimentares, simples, saudáveis e rápidas. O interesse associado às cozinhas com base em aromas e verduras frescas de qualidade manifesta preocupações de natureza diversa por parte do con- sumidor. Para além do prazer que sabores agradá- veis proporcionam, aos quais se alia a promoção da própria saúde, o interesse por este tipo de cozinhas revela também o sentido de consumos alimentares cujos modos de produção agrícola sejam amigos do ambiente e contribuam para revitalizar a pequena agricultura. Neste quadro, reabilitar antigas práticas alimentares tornou-se fonte de assumido interesse, quer para os Passou a generalizar-se o uso da gastronomia local, sobretudo, quando se trata de dinamizar as tradições alimentares. Todavia, estas dinâmicas ocorrem num contexto de declínio crescente das cozinhas tradicionais, quer ao nível dos procedimentos culinários, quer ao nível da qualidade dos produtos que lhe conferem a especificidade.

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