CULTIVAR 9 - Gastronomia

cadernos de análise e prospetiva CULTIVAR N.º 9 SETEMBRO 2017 16 estudiosos nesta área, quer para os decisores públi- cos e outros agentes de desenvolvimento. Uma das propostas que vem emergindo é a reconstrução da cultura gastronómica local como uma das compo- nentes das novas dinâmicas de territorialização das práticas de lazer e de consumo alimentar. E com ela despontam as interrogações: como analisar o renas- cer do interesse pela natureza ou pelas culturas ali- mentares locais? Como perceber o interesse pelo património? Como integrar as temáticas da sustenta- bilidade e da multifuncio- nalidade nas estratégias de desenvolvimento de um ter- ritório? Hoje em dia, falar de sus- tentabilidade implica uma abordagem integrada, em que as heranças do passado se imbricam na moderni- dade. Recuperar e perceber quais são os fundamentos das tradições, nomeada- mente alimentares e gastronómicas, tornou-se uma vertente incontornável a ser integrada em dinâmicas de desenvolvimento. Conferir-lhes um significado, transformando-as num valor económico, explica, em parte, a conhecida citação de Afonso de Barros: “ O espaço rural passou de espaço de onde se vem para espaço para onde se vai, de espaço de repulsão para espaço de atração, de espaço predominantemente agrícola para espaço predominantemente simbóli- co ” 1 . Esta ideia enuncia a complexidade da ques- tão. Tanto mais complexa quanto, do nosso ponto de vista, este “espaço simbólico” aqui enunciado, se refere sobretudo às componentes tangíveis contidas na responsabilidade ambiental, social e sensorial pela qual a produção agrícola se deve reger. Obvia- mente que está também em causa o modo como as 1 Afonso de Barros, citado por Joaquim, Graça (1997), “Da identidade à sustentabilidade ou a emergência do «turismo responsável»”, in Sociologia – Problemas e Práti- cas , n.º 23, Lisboa, CIES, pp. 71-100. modernas dinâmicas de desenvolvimento se devem centrar na cultura, na tradição, nos bens coletivos, identitários e patrimoniais. Sem esquecer que cabe conservar e transmitir às gerações vindouras estes valores, mas também potenciá-los enquanto recur- sos passíveis de gerarem alternativas económicas. E, claro, um desses recursos, como temos vindo a explicitar, é a gastronomia local. Aliás, a grande relevância das gastronomias tradicio- nais, enquanto conteúdos culturais das motivações turísticas é, inequivoca- mente, reconhecida no nosso país, através da sua promoção como patrimó- nio cultural nacional 2 . Esta decisão legitima não só as suas dimensões culturais, enquanto símbolo identi- tário, como também apela ao seu conhecimento e divulgação, nomeadamente com fins de valorização económica dos territórios. Comecemos por fazer o seu enquadramento, reen- contrando a paisagem, o território e a cultura que lhes são próprios. Paisagem, território e cultura A par da gastronomia, a paisagem e os elementos que configuram os territórios rurais estão hoje pro- fundamente associados aos conceitos de natureza e de ambiente. No imaginário coletivo, são encara- dos como um valioso património natural a preser- var e valorizar (José Neiva, 2007). Situemo-nos, por exemplo, no Alentejo, numa paisagem dominada 2 Consultar, a este propósito, o documento legislativo: Gas- tronomia como Património Cultural Nacional , Resolução do Conselho de Ministros n.º 96/2000, de 26 de Julho, Lis- boa, Portugal, 2000. http://data.dre.pt/eli/resolconsmin/96/2000/07/26/p/ dre/pt/html … falar de sustentabilidade implica uma abordagem integrada, em que as heranças do passado se imbricam na modernidade. Recuperar e perceber quais são os fundamentos das tradições, nomeadamente alimentares e gastronómicas, tornou-se uma vertente incontornável a ser integrada em dinâmicas de desenvolvimento. Conferir- lhes um significado, transformando-as num valor económico …

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