Editorial
EDUARDO DINIZ
Diretor-Geral do GPP
“
Comer é um ato incontornavelmente agrícola
”
1
O presente número da Cultivar, com o tema
Gastronomia,
suscitou um debate no seio da equipa
editorial relacionado com a dificuldade analítica e
de parametrização do tema. Com efeito, quer na
abordagem criativa da cozinha pelos
chefs
quer na
defesa da cozinha tradicional, e na relação destas
com os produtores, corre-se o risco de cair ou num
romantismo identitário ou num mimetismo das
últimas tendências da moda.
A nossa motivação ao promover esta edição pren-
de-se com a convicção de que, por um lado, não há
gastronomia sem produção agrícola e sem ligação
ao território, pois o sabor começa no solo (ou no
mar), e, por outro lado, os agricultores devem ver
a gastronomia como fator de valorização da pro-
dução agrícola e de promoção das especificidades
locais e regionais.
Para além disso, o tema gastronomia tem diferen-
tes intervenientes que encaram ou se apropriam
do conceito de modo distinto
2
. Com efeito, existem
1
Wendel Berry, citado no livro de Dan Barber,
The Third
Plate
, cuja recensão é apresentada na secção III desta edi-
ção.
2
Neste número, entende-se Gastronomia como a conju-
gação de conhecimento, arte e tradição que através da
combinação de métodos culinários sobre matérias-pri-
várias interações no domínio da gastronomia: cul-
tura, relações sociais, culinária, turismo, agricultura,
pesca, ambiente, dinamização dos territórios, etc.
Ou seja, a gastronomia enquanto fator de desen-
volvimento não esgota os seus ganhos no turismo,
ampliando o seu efeito para essas outras áreas.
Cerca de 8% da produção agroalimentar destina-se
aos serviços de alojamento e restauração e estima-
mos que o valor das exportações indiretas de bens
agroalimentares através dos hotéis, alojamentos e
restaurantes atinja cerca de 110 milhões de euros,
correspondendo ao consumo em território nacio-
nal desses produtos por não-residentes nessas uni-
dades (ver anexo ao primeiro artigo da secção II).
Para além da criatividade individual e da multiplici-
dade da oferta de produtos, é a ligação ao territó-
rio, simultaneamente recuperando e inovando tra-
dições seculares e experimentando o que a terra
efetivamente dá, que permite uma verdadeira dife-
renciação em termos de sabores, texturas e chei-
ros, fatores determinantes de uma gastronomia de
excelência.
mas agrícolas e piscatórias oferece experiências alimen-
tares que proporcionam gosto e prazer e podem contri-
buir para construir uma identidade territorial ou cultural
própria.