O Gabinete de Planeamento, Políticas e Administração Geral (GPP) promoveu uma sessão pública de debate dedicada ao tema da População e Território Rural, tendo por base a edição N.º 11 da publicação CULTIVAR. A sessão decorreu a 23 de abril no Salão do Marquês do MAFDR (Praça do Comércio, Lisboa). Programa
O Diretor-Geral do GPP, Eduardo Diniz, deu início à sessão, referindo a importância deste tema enquanto gerador de um debate aceso, principalmente após os incêndios ocorridos no ano de 2017, que conduziram a diversas questões - “O que é que se poderia ter feito melhor para que isto não tivesse ocorrido?”; “Como é que os incêndios ocorrem?”; “Quais as causas do mesmo?”
Referiu que a intenção do GPP, com a edição deste número da Cultivar, é tentar contribuir para uma reflexão profunda sobre estas matérias, sabendo-se que não é simples, dado o seu caráter multidisciplinar e associada muitas vezes a uma panóplia de instrumentos de atuação que nem sempre são eficazes.
Seguiu-se uma intervenção de enquadramento ao tema efetuada por um elemento da equipa editorial, Helena Sequeira, sobre os “Instrumentos de Política com expressão territorial”. Este estudo envolveu vários técnicos de organismos da agricultura, florestas e desenvolvimento ruarl e teve como principal objetivo enumerar os instrumentos de ordenamento do território que influenciam a definição e o uso do espaço rural.
A reforma legislativa (2014/2015) das matérias relativas ao território, nas vertentes solo, do ordenamento do território e do urbanismo, conduziu a alterações significativas no paradigma vigente e envolveu a articulação de regimes jurídicos setoriais. Esta nova legislação procedeu à distinção regulamentar entre “programas” e “planos”. Os primeiros são instrumentos da administração central de âmbito nacional. Os segundos são intervenções da administração local e vinculado aos particulares.
Outro aspeto importante a realçar com esta reforma legislativa teve a ver com o reforço dos instrumentos intermunicipais, permitindo aos municípios se associarem para desenvolver instrumentos de política que atuam ao nível do seu território. O novo Decreto-Lei procedeu à alteração das regras de “classificação e reclassificação do solo” com a introdução de um novo conceito de “solo urbano”. Esta medida teve como principal objetivo tornar mais flexíveis as decisões de urbanização em espaço rural, no entanto, corre-se o risco de a mesma contribuir para o aumento do desordenamento do território.
Concluiu-se que existe atualmente uma panóplia de instrumentos políticos e estratégias que atuam ao nível do território rural que dificultam a sua eficácia. A política de ordenamento deve ter em consideração todos os territórios e todos os instrumentos de atuação. Tem que haver uma articulação entre os instrumentos de gestão territorial e os instrumentos sectoriais com expressão territorial, devendo o território ter de ser pensado/planeado de uma forma integrada.
A sessão contou com as intervenções dos oradores convidados, tendo o Professor João Ferrão, da Universidade de Lisboa, começado por referir que situações extremas, como os incêndios ocorridos em 2017 podem conduzir para que se levem a sério situações que já se conheciam e que não podem, uma vez mais, serem evitadas. Estas situações extremas também podem “alimentar” alguns aspetos negativos, nomeadamente a relação entre o que aconteceu e o Ordenamento do Território e a ausência da tutela do Ordenamento do Território aquando da discussão.
Também elencou ideias atualmente erróneas, em particular a noção que existe algo uniforme chamado interior, dado que existem inúmeros interiores, cada uma com a sua especificidade. Salientou outro aspeto importante, de que atualmente o planeamento tem que ser pensado para territórios com perda demográfica, algo que até à data não estava equacionado. Atualmente existem três situações distintas de interior:
- Áreas estruturalmente em declínio (gestão em perda demográfica)
- Áreas que se encontram relativamente estabilizadas
- Áreas dinâmicas junto a zonas urbanas de média dimensão
Finalizou a sua intervenção, defendendo que não se pode pensar como um todo, aquilo que é diferenciado, tendo-se de olhar para o país de forma diferente (o nosso mapa cognitivo está desfasado das regiões do país).
A segunda intervenção foi efetuada pelo Professor Sidónio Pardal, da Universidade de Lisboa, que começou por referir que os instrumentos de planeamento vigentes estão repletos de irracionalidades primárias e hiperbolizados. Salientou que separação do uso dos solos entre urbano/rústico foi a primeira operação de planeamento do território e que conduziu a resultados irracionais. Esta irracionalidade é visível ao nível dos solos rústicos, ao não fazer a distinção de valor entre o uso agrícola e o uso florestal.
Por último, seguiu-se a intervenção do Presidente da Câmara do Cadaval, José Bernardo Nunes, que fez uma breve caraterização do seu concelho, referindo que o Cadaval é um concelho rural com uma densidade demográfica muito baixa, em que a maioria da população vive da agricultura. Alertou para a importância da viabilidade económica dos instrumentos de planeamento; os instrumentos de planeamento podem ser muito bons, na sua génese, mas se não tiverem rentabilidade económica, não serão implementados. A falta de viabilidade económica conduz ao abandono e despovoamento dos territórios. Referiu também que o PDM do Cadaval se encontra em revisão desde 2001, sem nenhum resultado concreto. Defende que devem ser salvaguardadas as atividades económicas sediadas no território.
O debate que se seguiu foi moderado por Tiago Oliveira (Presidente da Estrutura de Missão para a instalação do Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais), tendo sido abordadas as diversas questões associadas à temática em análise e contado com uma intervenção muito participada da plateia..
Nesta edição da CULTIVAR, dedicada ao tema da POPULAÇÃO E TERRITÓRIO RURAL, procura-se apresentar uma abordagem integrada para a qual concorrem várias políticas setoriais (florestal, agrícola, fiscal, entre outras) e em que é importante não só entender as dinâmicas sociais em presença (evolução demográfica, interações de residentes, proprietários e empresários), mas também conhecer melhor os instrumentos de ordenamento do espaço territorial.
Pretendeu-se nesta abordagem envolver as origens historicas, que explicam e condicionam a atual forma de organizacao territorial rural, e uma analise demografica e socioeconomica, que possa contribuir para a identificacao de solucoes para os problemas de ordenamento que se tem vindo a verificar no mundo rural e para as quais concorrem novos riscos associados as alteracoes climaticas.
A Edição n.º 11 da CULTIVAR encontra-se publicada em formato digital (pdf), para download, na página web do GPP - Publicações CULTIVAR.